Vida corrida depois de uma mudança de trabalho. Para não deixar o blog parado, segue um link sobre o texto que escrevi recentemente sobre marcas, transparência e sustentabilidade para a revista Amanhã.
http://www.amanha.com.br/home-2/1619-as-marcas-e-o-dilema-da-transparencia
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As marcas e o dilema da transparência |
Em um mundo em que os consumidores querem cada vez mais serem ouvidos e dialogar, um bom jeito de gerar confianca é pela transparência
por Rodrigo Vieira da Cunha Não é muito comum ver CEOs no palco do TED. Não há uma razão específica (ou talvez haja), mas o fato é que é assim. E desta vez, foram dois CEOs na sequência. Primeiro, falou Bill Ford (neto de Henry Ford), que pareceu à vontade no palco para mostrar que a Ford está olhando para o impacto ambiental causado pelos carros. De acordo com ele, temos hoje 800 milhões de carros, número que saltará para algo entre 2 e 4 bilhões em 2050! Bill Ford mencionou isso para falar de uma série de iniciativas para melhorar a eficiência dos carros e diminuir o impacto no meio ambiente. Depois dele, falou Indra Nooyi, CEO da Pepsi. Ela começou dizendo que pediu a sua secretária que fizesse uma pesquisa e com isso descobriu que apenas um pequeno percentual dos palestrantes do TED eram CEOs e que achava isso curioso. Segundo ela mesma, a explicação poderia ser o fato de que os CEOs em geral não são confiáveis… Então, falou como uma grande empresa pode contribuir com o mundo e conquistar confiança dos consumidores desta maneira. Daí em diante, Indra apresentou detalhes sobre Pepsi Refresh, um projeto inteligente que patrocina ideias com o potencial de mudar o mundo. O PepsiRefresh começou com uma ótima sacada de marketing: em vez de colocar milhões para fazer anúncios no tradicional SuperBowl, final do campeonato de futebol americano, a Pepsi utilizou este dinheiro para financiar ideias e lançou o projeto no início do ano passado. O mérito é indiscutível e aqui chego ao ponto que gostaria de abordar. Com a mensagem que passaram, Ford e Pepsi realmente pareceram empresas preocupadas com o impacto que causam e também em fazer negócios melhores. Mas parece que não estão exercendo todo seu potencial. As grandes empresas têm um poder enorme de mudar o mundo. São elas que se relacionam com milhões de consumidores, milhares de fornecedores, acionistas, governos e sociedade em geral. As decisões das empresas impactam a maneira como o mundo funciona. Levando isso em conta, possivelmente Ford e Pepsi perderam chances relevantes de ganhar pontos e confiança dos consumidores em suas falas no TED, que sempre aponta tendências e reverbera por meio de formadores de opinião no mundo inteiro. Bill Ford deixou de passar uma visão mais ampla ao mostrar que está preocupado em melhorar o transporte como um todo, não apenas a parte que na sua visão lhe cabe, a dos carros. Talvez a grande oportunidade do futuro para a Ford seja a de integrar os automóveis com outros meios de transporte, pois é bem possível que em um mundo com 4 bilhões de carros não exista espaço físico para circular… Já Indra provocou sentimentos mistos na plateia do TED. Pelo twitter, as pessoas reclamavam da onipresença da marca Pepsi na apresentação e da falta de informações sobre como a empresa está transformando o negócio em busca da sustentabilidade. Um projeto social relevante como o Pepsi Refresh é muito legal, mas é paralelo ao negócio. Como a Pepsi faz para diminuir o impacto da logística? Como diminui a quantidade de água usada na produção dos refrigerantes? O que faz para estimular práticas de alimentação mais saudáveis? São questões que ficaram sem respostas nas falas dos CEOs. E este é o problema. Em um mundo em que os consumidores querem cada vez mais serem ouvidos e dialogar, um bom jeito de gerar confianca é pela transparência. E mostrando resultados: alguns anos antes, no próprio TED, outro CEO falou e ajudou a fixar sua mensagem de reinvenção dos negócios. O nome dele é Ray Anderson e o que ele fez foi transformar sua empresa, a Interface, ao criar um dos modelos de negócios mais sustentáveis do mundo, diminuindo muito o impacto desde o início do processo em 1996. De lá para cá, a empresa reduziu em 43% a quantidade de energia necessária para fabricar carpetes, diminuiu 44% a emissão de gases (ou 94% se considerar a compensação) e ao mesmo tempo aumentou a receita líquida em 27% no mesmo período. Os resultados estão lá, de maneira transparente, no site da empresa. Talvez os CEOs (nem todos) incomodem em suas mensagens porque está todo mundo cansado de monólogos. Regimes ditatoriais estão caindo no oriente médio e no mundo árabe por conta disso. Iniciativas como Wikileaks ganham projeção por causa disso. É muito melhor as marcas admitirem que nem tudo é perfeito, que existem falhas e que o processo é evolutivo, do que pegar o microfone para dizer: “olha como somos legais”. Isso não gera relevância, mas afastamento. Não se trata de um dilema sobre abrir ou não fraquezas, mas sim de admitir que há o que melhorar. A transparência não é um dogma e mais do que um momento, é um movimento da sociedade. Lento, mas em pleno avanço. Só quem estiver disposto a pedir ajuda, a ouvir, vai perceber a oportunidade que isto traz. E quem não estiver, pode ficar para trás. Assista Ray Anderson falando sobre a lógica de mercado da sustentabilidade |