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As marcas e o dilema da transparência

Vida corrida depois de uma mudança de trabalho. Para não deixar o blog parado, segue um link sobre o texto que escrevi recentemente sobre marcas, transparência e sustentabilidade para a revista Amanhã.

http://www.amanha.com.br/home-2/1619-as-marcas-e-o-dilema-da-transparencia

 

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As marcas e o dilema da transparência

Em um mundo em que os consumidores querem cada vez mais serem ouvidos e dialogar, um bom jeito de gerar confianca é pela transparência

por Rodrigo Vieira da Cunha
Na última edição do TED, conferência americana sobre inovação e ideias, no início deste mês, duas grandes empresas protagonizaram um momento muito interessante na gestão de suas marcas. Os líderes da Ford e da Pepsi  subiram ao palco do TED para falar de seus trabalhos à frente destas empresas, ícones do capitalismo.

TED_bill_ford350Não é muito comum ver CEOs no palco do TED. Não há uma razão específica (ou talvez haja), mas o fato é que é assim. E desta vez, foram dois CEOs na sequência. Primeiro, falou Bill Ford (neto de Henry Ford), que pareceu à vontade no palco para mostrar que a Ford está olhando para o impacto ambiental causado pelos carros. De acordo com ele, temos hoje 800 milhões de carros, número que saltará para algo entre 2 e 4 bilhões em 2050! Bill Ford mencionou isso para falar de uma série de iniciativas para melhorar a eficiência dos carros e diminuir o impacto no meio ambiente.

Depois dele, falou Indra Nooyi, CEO da Pepsi. Ela começou dizendo que pediu a sua secretária que fizesse uma pesquisa e com isso descobriu que apenas um pequeno percentual dos palestrantes do TED eram CEOs e que achava isso curioso. Segundo ela mesma, a explicação poderia ser o fato de que os CEOs em geral não são confiáveis… Então, falou como uma grande empresa pode contribuir com o mundo e conquistar confiança dos consumidores desta maneira. Daí em diante, Indra apresentou detalhes sobre Pepsi Refresh, um projeto inteligente que patrocina ideias com o potencial de mudar o mundo. O PepsiRefresh começou com uma ótima sacada de marketing: em vez de colocar milhões para fazer anúncios no tradicional SuperBowl, final do campeonato de futebol americano, a Pepsi utilizou este dinheiro para financiar ideias e lançou o projeto no início do ano passado.

O mérito é indiscutível e aqui chego ao ponto que gostaria de abordar. Com a mensagem que passaram, Ford e Pepsi realmente pareceram empresas preocupadas com o impacto que causam e também em fazer negócios melhores. Mas parece que não estão exercendo todo seu potencial. As grandes empresas têm um poder enorme de mudar o mundo. São elas que se relacionam com milhões de consumidores, milhares de fornecedores, acionistas, governos e sociedade em geral. As decisões das empresas impactam a maneira como o mundo funciona. Levando isso em conta, possivelmente Ford e Pepsi perderam chances relevantes de ganhar pontos e confiança dos consumidores em suas falas no TED, que sempre aponta tendências e reverbera por meio de formadores de opinião no mundo inteiro.

Bill Ford deixou de passar uma visão mais ampla ao mostrar que está preocupado em melhorar o transporte como um todo, não apenas a parte que na sua visão lhe cabe, a dos carros. Talvez a grande oportunidade do futuro para a Ford seja a de integrar os automóveis com outros meios de transporte, pois é bem possível que em um mundo com 4 bilhões de carros não exista espaço físico para circular… Já Indra provocou sentimentos mistos na plateia do TED. Pelo twitter, as pessoas reclamavam da onipresença da marca Pepsi na apresentação e da falta de informações sobre como a empresa está transformando o negócio em busca da sustentabilidade. Um projeto social relevante como o Pepsi Refresh é muito legal, mas é paralelo ao negócio. Como a Pepsi faz para diminuir o impacto da logística? Como diminui a quantidade de água usada na produção dos refrigerantes? O que faz para estimular práticas de alimentação mais saudáveis?

São questões que ficaram sem respostas nas falas dos CEOs. E este é o problema. Em um mundo em que os consumidores querem cada vez mais serem ouvidos e dialogar, um bom jeito de gerar confianca é pela transparência. E mostrando resultados: alguns anos antes, no próprio TED, outro CEO falou e ajudou a fixar sua mensagem de reinvenção dos negócios. O nome dele é Ray Anderson e o que ele fez foi transformar sua empresa, a Interface, ao criar um dos modelos de negócios mais sustentáveis do mundo, diminuindo muito o impacto desde o início do processo em 1996. De lá para cá, a empresa reduziu em 43% a quantidade de energia necessária para fabricar carpetes, diminuiu 44% a emissão de gases (ou 94% se considerar a compensação) e ao mesmo tempo aumentou a receita líquida em 27% no mesmo período. Os resultados estão lá, de maneira transparente, no site da empresa.

Talvez os CEOs (nem todos) incomodem em suas mensagens porque está todo mundo cansado de monólogos. Regimes ditatoriais estão caindo no oriente médio e no mundo árabe por conta disso. Iniciativas como Wikileaks ganham projeção por causa disso.  É muito melhor as marcas admitirem que nem tudo é perfeito, que existem falhas e que o processo é evolutivo, do que pegar o microfone para dizer: “olha como somos legais”.  Isso não gera relevância, mas afastamento. Não se trata de um dilema sobre abrir ou não fraquezas, mas sim de admitir que há o que melhorar.

A transparência não é um dogma e  mais do que um momento, é um movimento da sociedade. Lento, mas em pleno avanço. Só quem estiver disposto a pedir ajuda, a ouvir, vai perceber a oportunidade que isto traz. E quem não estiver, pode ficar para trás.

Assista Ray Anderson falando sobre a lógica de mercado da sustentabilidade

 

 

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Transparência e diálogo: tendências do TED2011

Nesta era de dados que trafegam na velocidade da luz, ainda estamos tentando dar vazão e compreender o que se faz com tanta informação. Principalmente quando ela é capaz de derrubar regimes e sistemas complexos e estabelecidos há anos. Não à toa, o tema transparência esteve muito presente no TED 2011.

Ainda no primeiro bloco, Wadah Khanfar, diretor da Al-Jazeera, falou sobre a revolução na Tunísia, e como a transparência sobre o que estava acontecendo via disseminação da mensagem pela televisão e outros meios ajudou a dar força ao movimento. Emocionado, ele disse que: “uma nova geração conectada e inspirada por valores comuns criou uma nova realidade para nós. Estamos testemunhando história, o nascimento de uma nova era”.

O executivo do Google Wael Ghonim, que teve papel-chave na mobilização via redes sociais que acelerou a queda do ditador egípcio é um exemplo marcante do nascimento desta nova era. Ele repetiu sua frase que já se tornou a marca desta revolução colaborativa: “Não houve um herói, porque todos foram heróis.” E também disse: “O poder das pessoas é muito mais forte do que as pessoas no poder”.

As marcas e a transparência

Morgan Spurlock, o autor do filme SupersizeMe, foi direto ao ponto transparência. Sua nova empreitada que vai sacudir o mercado publicitário, que não é o que se pode chamar de grande exemplo de transparência… A ideia foi criar um filme chamado “The greatest movie ever sold”, ou o “maior filme já anunciado”. O objetivo foi fazer um filme cujo único propósito era anunciar o próprio filme. Uma grande sacada. Ele foi atrás de marcas para ajudar a financiar, mas obviamente ninguém topou. É claro que durante todo o processo, Spurlock abusou do bom humor para mostrar como funciona o mundo da publicidade. Hoje, em média, uma pessoa recebe cerca de 1500 mensagens publicitárias por dia (procurei estudos sobre isso, quem quiser pode me pedir a fonte que variavam entre 800 a 3000 mensagens por dia – fiquemos na média). Faz-se de tudo para chamar a atenção para uma marca, muitas e muitas vezes prometendo aquilo que não pode ser cumprido… Spurlock disse que tem esperança que seu filme faça com que as companhias pratiquem mais a transparência, um elemento que ele disse ter sentido falta em suas viagens pelos Estados Unidos na produção.

Spurlock e sua nova empreitada: uma balançada no mercado publicitário

No mesmo bloco de Spurlock, coincidentemente ou não, falaram dois executivos responsáveis por grandes empresas, Indra Nooyi, da PepsiCo, e Bill Ford, da Ford. Bill Ford estava mais à vontade do que Indra, mas só no início da palestra. Bill mostrou que a Ford está sim preocupada com o impacto ambiental dos carros, mas partiu da premissa que o número de carros não vai deixar de crescer exponencialmente. Fiquei um pouco frustrado. Achei que ele apresentaria opções para um transporte mais eficiente e não apenas para carros mais eficientes. Segundo ele, temos hoje 800 milhões de carros, número que saltará para algo entre 2 e 4 bilhões em 2050. Assustador.

Indra perdeu uma grande oportunidade também ao focar demasiadamente no seu negócio. Ironicamente, ela começou dizendo que fez uma pesquisa e descobriu que apenas um pequeno percentual dos palestrantes do TED eram CEOs e que achava isso curioso e cuja explicação pode ser o fato de que os CEOs em geral não são confiáveis. Então, começou a falar (bem) sobre sua visão de negócio, sobre como uma grande empresa pode contribuir com o mundo e conquistar confiança dos consumidores desta maneira . E aí no segundo terço em diante, a palestra desandou. Indra se pôs a falar do Pepsi Refresh, um projeto muito bacana, mas que não tem nada a ver sobre a reinvenção do negócio em busca de sustentabilidade.

A plateia do TED não gostou nem ao vivo e nem nas redes sociais. Muitos criticaram a visão excessiva do produto. Eu fiquei particularmante incomodado com a visão onipresente da marca Pepsi nos slides. Enquanto muitas pessoas estão lá falando de projetos incríveis de vida ou da construção de um mundo melhor, o foco excessivo em um projeto de uma marca não caiu bem. No último bloco, num primor de transparência e abertura ao feedback, Chris Anderson deu espaço para que as pessoas fizessem falas de feedback de 1′. Uma delas foi dirigida à Ford e outra a Indra. A crítica à Ford foi a que mencionei (falta de visão do todo) e a da PepsiCo foi mais dura. No lugar de chamar a atenção para a reinvenção do processo produtivo, ao expor a marca em demasia, Indra atraiu a antipatia das pessoas. Então alguém disse que por mais que falasse bem da marca, não tinha como amenizar o fato de que a PepsiCo vendia água açucarada para as crianças.

Críticas à Pepsi: água açucarada para crianças

 

O caminho: diálogo

A mensagem foi mesmo dura, até radical, mas o ponto nem é este. O ponto é que as marcas e empresas ainda estão aprendendo a lidar neste mundo. O fato de um CEO do porte da Pepsi não entender como fazer uma fala em um evento de vanguarda como o TED mostra uma certa desconexão com o momento. E até explica porque não há tantos CEOs por lá. Será pelo fato de não falarem a mesma língua? A cobrança e interação das pessoas será cada vez maior. Definitivamente não será fácil a vida das grandes marcas daqui para frente se não conseguirem provar sua relevância.

O importante, principalmente para as marcas, é manter o diálogo. Depois de sua fala, o documentarista Spurlock ainda disse ao Huffington Post, que acredita que a transparência será algo cada vez mais necessário frente à vontade de as pessoas em saberem e trocarem mais informações via redes sociais. E de novo caímos no tema redes sociais e web. A crescente procura por transparência está crescendo graças à web e ao momento da civilização. Um site como o Wikileaks não existiria se não fosse tão fácil espalhar informações. As revoluções no Oriente Médio têm muto de sua força e rapidez graças à troca de informações. Apesar de ainda não ser livre e transparente em todos os lugares, como na China, por exemplo, de onde veio um vídeo gravado por Ai Weiwei, artista dissidente chinês cujo nome foi banido dos serviços de busca na web chinesa.

Ai Weiwei fez uma das reflexões mais profundas, que toca diretamente também no tema da transparência. Sobre sua situação e de outros na China, ele disse que as nações ocidentais estão tolerando aquilo que está acontecendo. “É uma visão curta. (…) Todo o sistema está se tornando corrupto e nossa sociedade está sacrificando o meio-ambiente, nossa cultura, para se tornar rica.” A frase de Ai Weiwei traz muitas reflexões. Uma delas pode ser a própria capa da Wired que está nas bancas neste mês, questionando o modelo de produção chinês para produzir gadgets como iPods e iPads, entre outros. A revista questiona qual a responsabilidade de cada um neste processo e se já não é hora de olhar mais a sério para isso.

Wired e a capa polêmica: você deve se preocupar?

Vício de jornalista, fui conversar com o outro lado, um amigo chinês que fiz lá em Palm Springs. Professor de universidade importante, intelectual, não bateu palmas ao final do vídeo gravado clandestinamente por Ai Weiwei e enviado ao TED. Aquilo me intrigou e mais tarde, em uma festa de confraternização da conferência, fui perguntar a opinião dele sobre o vídeo. Com semblante sério, disse que não gostou de ver “roupa suja sendo lavada em público”. Segundo ele, o governo chinês está fazendo tanta coisa, tirando tanta gente da miséria, que achava melhor dar crédito e tratar estas questões internamente antes de expôr o país nesta situação. Confesso que fiquei surpreso com esta reação, que carrega um sentimento de patriotismo maior até que a causa da liberdade de expressão. Respeito, mas acho difícil entender.

Países como a China abusam dos filtros na internet, mas eles não estão presentes apenas nas escolhas de agentes do governo. Eli Pareser, autor do livro “The Filter Bubble” fez uma fala bastante intrigante sobre este assunto. Segundo ele, os algoritmos que filtram as buscas do Google, Yahoo ou de qualquer outro serviço que apresente informações a seu pedido ou não, estão filtrando a realidade, escondendo informações desconfortáveis. “Os algoritmos não tem a mesma ética que os editores. Nós precisamos que os editores de informações coloquem um senso de responsabilidade nos algoritmos”, disse. “Eles mostram o que queremos ver e nem sempre o que precisamos ver.” Numa época em que se vive a busca por maior transparência, sem nem mesmo sabermos onde isso vai nos levar, não será surpresa a emergência de realidades mais cruas. É o que Morgan Spurlock falou em relação à transparência das marcas e o que começou a explorar em SupersizeMe e agora irá mais fundo no novo documentário. O mundo está cada vez mais em ON e com a definição de telas HD. Está cada vez mais difícil esconder as coisas.

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WikiLeaks: a transparência veio para ficar

A transparência na era 2.0

A nova revelação dos documentos secretos do WikiLeaks trouxe uma discussão excelente à tona. O pano de fundo é a transparência, ainda que por vezes o foco fique na relevância ou não dos documentos revelados.

Em uma carta ou e-mail, ninguém envia informações que não gostaria que fossem passadas adiante. Quando alguém está falando ao telefone, só fala tudo o que pensa para alguém muito confiável e quanto tem certeza que não está sendo gravado. Os diplomatas expostos no caso dos diplomatic cables (mensagens diplomáticas) estavam falando em uma via confiável e – aparentemente – segura. E aí falavam tudo o que pensavam, mas não necessariamente aquilo que fariam em público. Ou seja, nem sempre de maneira ética ou transparente.

A sociedade é baseada em pequenas mentiras (white lies) alguns vão pensar. Sem elas, as relações não se sustentariam. Sim, mas white lies não fazem mal a ninguém. Neste caso, estamos falando de assuntos sérios, que envolvem milhões de vidas. Em alguns casos revelados, as informações ajudam a entender melhor o mundo e em outros dão a origem correta para algumas questões. Em outras, revelam planos de assassinatos. As fontes são os diplomatas, que podem ter interesses próprios ou usar informações a seu favor. Mas como estavam falando em um canal que consideravam seguro, falavam tudo o que pensavam. Por isso, as informações críveis. É o sol como desinfetante.

A transparência, que está no centro do debate, chegou para ficar. Queira-se ou não. O WikiLeaks se propõe a receber arquivos confidenciais para depois disponibilizá-los para grandes veículos. (O primeiro estrago do site foi a revelação de diálogos escrachados de soldados americanos matando civis iraquianos.)

No TED Global, em julho passado, Julian Assange, o responsável pelo serviço/site foi o convidado surpresa e expôs suas convicções. Na época, ele havia revelado o assassinato de civis iraquianos no caso que ficou mais conhecido. Chris Anderson, do TED, estava conduzindo a entrevista e em certo momento perguntou para a plateia se achavam Assange um perigo à ordem pública ou um herói. A esmagadora maioria falou que ele era um herói.

Não é o que estão pensando os governantes americanos, que estão buscando censurar o WikiLeaks e nem mesmo a justiça Sueca, que fez uma acusação de que Assange teria cometido estupro. O certo é que a verdade dói muitas vezes. Mais certo ainda é que daqui para frente, se você não quiser que alguma posição seja pública, não emita. O mundo em off é cada vez mais um anacronismo das relações entre jornalistas e fonte. Um segredo quando contado deixa de ser segredo. Off is off now.

No fundo, o WikiLeaks representa os maiores dilemas que vivenciamos hoje, com o excesso de informações (foram 250 000 e-mails vazados!), abertura cada vez maior, interdependência e velocidade trafegando à velocidade da luz.

Fui conversar com um jornalista amigo em quem confio muito sobre a opinião dele em relação ao WikiLeaks. A resposta foi primorosa. Vou reproduzir:

“Sobre o WikiLeaks, acho que transparência é bom, Rodrigo. Mas, pergunto eu, qual valor pode ser defendido de forma incondicional e irrestrita? Eu procuro, procuro, e não acho um que seja: nem liberdade, nem verdade, nem transparência. Todos estes valores admitem algum nível de restrição que é arbitrado pelo interesse coletivo. Creio, meu amigão Rodrigo, que qualquer tipo de fundamentalismo é potencialmente perigoso — inclusive o da transparência. Eu só admitiria rever esta minha opinião se o homem, e as comunidades humanas, fossem, enfim, perfeitas. Perfeitas na ação e no pensamento. E não são.”

Julian Assange: ativista ou jornalista?

Assange, mais do quem jornalista, está sendo visto como um ativista. Sua teoria sobre o que o WikiLeaks pode cumprir é interessante:

“Quanto mais secreta ou injusta uma organização é, mais os vazamentos causarão medo e paranoia na sua liderança. Isso minimiza da eficiência dos mecanismos de comunicação internos (aumentando o custo da “taxa de segredo”) e do conhecimento do sistema, resultando numa perda da habilidade de se agarrar ao poder à medida que o ambiente exige adaptação. Assim, num mundo em que os vazamentos são fáceis, sistemas secretos ou injustos são mais impactados do que em sistemas abertos e justos. Os sistemas injustos são, por isso, extremamente vulneráveis a vazamentos em larga escala.”

Há quem considere o WikiLeaks apenas uma pequena vitória da transparência, mas na verdade um tiro no próprio pé. A Economist disse que no final das contas, ao querer lutar por transparência, Assange vai causar uma diminuição na circulação de informações.

Enfim, uma discussão apaixonante, típica de um momento de intensa transformação e adaptação da sociedade. Para ajudar a entender melhor, segue aqui uma coletânea de notícias recentes para entender melhor o impacto do WikiLeaks nos últimos dias, com ajuda na curadoria do meu colega @dkeichi

WikiLeaks ataca de novo

Comentário do Noam Chomsky

Time já está considerando Assange para personalidade do ano:

Risco de vida

Assange é um ativista mais do que jornalista

Gráfico interessante que mostra os documentos por país

Irlanda foi contra e bloqueou o fornecimento de armas americanas na guerra de Israel x libano

Guerra Russia x Georgia – na época todo mundo condenou a Russia, quem na verdade começou foi a Georgia

Thy The Wikileaks Document Release Is Key To A Functioning Democracy:

How Wikileaks Changes Things For Us All

From WikiChina (Thomas Friedman, to NY Times)

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O poder das empresas de mudar o mundo

Abaixo, compartilho o material que prepararei para minha fala no TEDx Santos, no último 28 de setembro. Em breve, deveremos ter o vídeo da palestra. E aí voltarei ao assunto aqui. Espero que gostem.


O incrível potencial de conexão das pessoas pode provocar a mudança de prática das empresas, que podem mudar o mundo. É claro que ninguém resolve nada sozinho. As empresas precisam da ajuda de governos, academia, mídia, enfim, a sociedade como um todo. Mas quero focar aqui no poder das empresas.

A economia é o jeito pelo qual estamos organizados. Com honrosas exceções que confirmam a regra, como Gandhi, Martin Luther King e Madre Teresa de Calcutá, são os recursos financeiros que influenciam a mudança do mundo.

Nos últimos 10 anos encontrei casos de empresários e empreendedores que estão mudando o mundo com uma série de pequenas ações.

Esta história passa um pouco pela minha carreira. Sou jornalista e depois de alguns anos trabalhando na imprensa em veículos como Veja, Você s/a e Zero Hora, recebi o convite para trabalhar no Banco Real em 2003. Aceitei. Não porque sempre tive o sonho de trabalhar em um banco, mas porque achava que um banco que negava empréstimos de milhões de reais para alguns clientes por questões ambientais e na outra ponta fazia empréstimos de quantias como 1000 reais no microcrédito investia em algo que sempre acreditei: valores.

Tomei a decisão ir trabalhar no Banco e quando me dei por conta, eu, um surfista, estava usando terno, gravato e sapato e meia preta todo o dia. Depois de uma breve passagem pelo marketing, fui para a Diretoria de Desenvolvimento Sustentável para ajudar a estruturar a comunicação sobre o tema. Nestes últimos sete anos, tive a oportunidade de conhecer uma grande quantidade de empreendedores e pessoas que praticam a sustentabilidade como estratégia central de negócio.

Gostaria de apresentar a vocês aqui alguns destes nomes. Quero por meio disso mostrar que está ao alcance de todos e que podemos, sim, fazer um mundo melhor por meio do ambiente dos negócios.

Há um ditado budista que diz que não conseguiremos fazer um mundo melhor com 100 grandes ideias, mas sim com pequenas ações no dia-a-dia.

Há estudos mostrando que das 100 maiores economias do mundo, cerca de 50 são empresas (os dados variam ano a ano de acordo com o faturamento das empresas e PIB dos países). É reflexo de um processo que começou na revolução industrial e fez o poder mudar de mãos: da igreja e Estado para a instituição corporação.

As empresas têm o poder econômico e são capazes de influenciar até decisões de governo e mudanças nas cadeias de negócios.

E aqui fica a pergunta para reflexão: como usar bem este poder? O que valorizar? O que queremos construir com as empresas?

Vou citar alguns exemplos agora: há pouco anos, quando começou a olhar de forma estrutuada para o tema sustentabilidade, o Walmart, uma das maiores empresas do mundo, tomou a decisão de não mais comprar de fornecedores que não pescassem de de maneira sustentável. Isso provocou uma grande mudança em milhares de fornecedores ao redor do mundo que começaram a cuidar destas questões.

Farra do Boi na Amazônia, estudo do Greenpeace

Não precisamos ir longe. No ano passado, o Greenpeace lançou um relatório chamado a Farra do Boi sobre o avanço da pecuária sobre a Amazônia. Em seguida, três grandes varejistas decidiram que não mais comprariam carne de frigoríficos que não conseguissem provar que os animais abatidos não vinham de pastos criados com o desmatamento ilegal. A reação foi rápida e os frigoríficos mudaram suas práticas.

Está cada vez mais claro que as restrições financeiras ajudam a mudar algumas práticas. Mas será que é somente disso que precisamos ou que conseguiremos fazer a mudança necessária?

A resposta é não. E há exemplos disso. São os empresários e empreendedores, os heróis do dia-a-dia, que provam que não.

São líderes que reconhecem a importância da interdependência em nosso dia-a-dia. E sabem que suas atitudes são capazes de mudar o ambiente de negócios para melhor.

As empresas que estão conquistando mercados hoje estão deixando de lado a máxima cristalizada de Milton Friedman, prêmio Nobel, que o negócio dos negócios são os negócios. Sim, são os negócios, mas também algo mais: investir em modelos de negócios sustentáveis.

Peter Drucker, o grande guru da administração moderna, lembra que as empresas existem por uma finalidade: o cliente. Vamos pensar por um momento no cliente como sociedade, ousando criar algo em cima da obra de Drucker.

O aumento da percepção da interdependência e da relevância de todos interessados nas decisões do cliente, a empresa só existe se estiver de acordo com as vontades da sociedade. Regulações, disputas de clientes, multas ambientais – se a empresa fizer algo que não agrada ao cliente, à sociedade, será processada por isso.

Neste sentido, o lucro não é um fim, algo a ser buscado – mas sim uma medida de sucesso, o teste de viabilidade. Se atender ao cliente, à sociedade, o lucro será consequência.

Essa perspectiva tira o foco de resultados e leva para a visão de que é necessário gerar valor. O que importa cada vez mais quando olhamos para os resultados da empresa não é somente o quanto os resultados mostram, mas como eles foram atingidos.

Nos próximos anos, quatro tendências vão marcar o mundo dos negócios: colaboração, ética, transparência e sustentabilidade. De certa maneira, elas estão todas ligadas e as empresas que olharem para isso terão grandes vantagens competitivas.

Algumas empresas conseguem lucrar colocando estas questões no dia-a-dia dos negócios. Empresas que negligenciam ou ignoram estão virando pó.

Vale lembrar do que aconteceu com as grandes empresas em casos nem tão recentes, mas emblemáticos: Enron, WorldCom. Estas empresas manipularam os balanços para mostrar bons resultados para os acionistas. Acabaram desmascaradas.

A capa da Time com as mulheres que denunciaram os escândalos da Enron e outros


Pesquisas indicam que os seres humanos são movidos à reciprocidade. As redes sociais espelham isso. O famoso toma-lá-dá-cá. Se você fizer algo que eu gosto, devolverei isso a você. Se me fizer mal, farei mal a você também. Estas empresas trapacearam, tiveram falhas graves de gestão e tentaram esconder isso dos consumidores e da sociedade. A WorldCom entrou em processo de falência e foi adquirida por outra empresa. A Enron faliu em 2001 e levou junto a consultoria Arthur Andersen, que aprovara os balanços.

Aparte a visão maniqueísta, são exemplos claros da visão sistêmica, de que as empresas fazem parte de um todo e não operam de maneira independente.

Na outra ponta, temos empresas como a Natura, que alavancou sua marca investindo em questões relevantes para seus consumidores, fornecedores e sociedade, criando produtos que valorizam o meio ambiente e as relações entre as pessoas. Em 2005, depois de uma trajetória brilhante, a Natura abriu o capital, num processo muito bem-sucedido. Em 2007, no entanto, teve problemas de gestão de produtos e não conseguiu atender a demanda dos consumidores. O mercado penalizou as ações das empresas e o momento serviu para a Natura se apoiar firmemente nos seus valores. Não cedeu às pressões do mercado e deu a volta por cima e em 2009 foi escolhida a empresa do ano pela revista Exame.

A Natura, melhor empresa de 2009

Outro exemplo vem dos Estados Unidos. Em 1972, foi fundada a incrível Patagônia, empresa de roupas e materiais esportivos, que ajudou a criar uma rede de empresas chamada 1% para o planeta e entre outras coisas, deixa que os funcionários montem suas agendas de acordo com suas vontades, como surfar ou escalar montanhas em dias perfeitos para isso. O fundador escreveu um livro chamado Let My People Go Surfing. Nele, fala da maturidade de reconhecer a responsabilidade de cada um e valorizar isso para criar um bom ambiente de trabalho. Então, não se trata de ser ‘bom mocinho’, mas de apostar na maturidade.

O livro com a biografia de Yvon Chouinard e a história da Patagonia

Mas eu queria também falar aqui de outros casos nem tão conhecidos, mas igualmente relevantes. Nem só de grandes empresas é feito o mundo dos negócios. Muito pelo contrário. As pequenas empresas, que representam o maior contingente de empregos no Brasil. Hoje, de cada três novas vagas, duas são geradas nas PMEs.

Há empreendedores de pequenas e médias empresas que encontraram seus nichos e encontram eco para o que fazem no reconhecimento do mercado.

Ione Antunes é outro exemplo. Ela criou em 1996 a empresa Help Express, de entregas de materiais por meio dos famosos motoboys. Ione desde o início acreditou que os motoboys não precisariam ser maltratados ou que era necessário remunerá-los por entrega em vez de assinar suas carteiras. Sempre cuidou bem deles e até os estimulou a criar um código de ética, onde constam pérolas como: Não ficarás no fliperama e não chutarás o retrovisor alheio. Na última década, com estes cuidados simples, mas poderosos, Ione conseguiu fazer sua empresa crescer na faixa dos 40% ao ano.

Vamos pensar em outro exemplo. Academia de ginástica. Quem nunca começou a fazer academia e se sentiu incomodado com a barriguinha ou mesmo com o ritmo que os treinadores tentavam impor? E aquele ambiente 100% geração saúde… Tony, um empresário paulistano, percebeu que isso incomodava seus pais e por conta disso nunca encararam uma academia. Segundo ele, muita gente vai fazer atividade física por recomendação médica e precisa se sentir à vontade para continuar o ritmo de exercícios. Então, ele, que sempre gostou de esportes, criou um conceito diferente de academia, a Ecofit, para acolher estas pessoas. Cresce 30% ao ano…

(Este caso não entrou na fala por conta do tempo.) Agora, vamos pensar no turismo. Em pousadas em locais paradisíacos. Estes locais, quando viram moda, correm o risco de perder seu maior encanto, o caráter preservado. Em 1992, um empresário dono de pousada, decidiu reproduzir no Brasil o conceito de Relais Chateau, de pousadas de charme, que existe na Europa e em outros lugares do mundo. E criou por aqui a Roteiros de Charme. Para fazer parte da associação, a pousada precisa cumprir requisitos básicos de charme, sofisticação, estar em um lugar agradável e ter cuidados sociais e ambientais. Todos os associados passam por vistoria periódica. Mais do que isso: cada associado leva para sua região a preocupação com os cuidados das pessoas e do meio ambiente por meio de palestras para outros hotéis da região. A Roteiros de Charme vai muito bem, obrigado.

(Este caso também não entrou na fala por conta do tempo.) Em outro exemplo, o americano Ray Anderson, fundador da Interface, fabricante de carpetes, diz que mudou seu negócio por basicamente duas situações. Por que leu um livro chamado Ecologia do Comércio, de Paul Hawken e por que um consumidor perguntou a ele o que fazia com os carpetes usados… Ele não sabia a resposta. Mas não teve medo da pergunta e a levou para dentro da empresa, para transformar seu negócio.

Estes casos mostram empresas absolutamente afinadas com seu tempo. O Brasil e o mundo evoluem rapidamente, junto com o ambiente dos negócios. Os consumidores estão mais exigentes e cobrando seus direitos. Há muitos lugares para se fazer ouvir: além dos tradicionais rádio, TV e jornal, há sites de Procon, de estímulo a cidadania, sem falar das redes sociais: Facebook, Orkut, Twitter etc.

Os jovens e consumidores em geral já não prestam atenção somente às propagandas, mas cada vez mais naquilo que é dito sobre as marcas em diversos lugares, como nas redes sociais. É lá que eles buscam informações de compra.

O mundo é cada vez mais transparente, não há como empurrar uma imagem para o consumidor e entregar outra coisa. Este ano tivemos um episódio que já ganhou seu espaço na história. Foi o caso da British Petroleum, a BP, que estava querendo mudar seu nome para Beyond Petroleum, para ligar a marca ao desenvolvimento de energia limpa. O desastre com a plataforma Deepwater Horizon, um dos maiores da história, jogou tudo por água acima. Independente de quem tenha sido a culpa, este foi um abalo tremendo na imagem da BP. E uma perda de 70 bilhões de dólares em valor de mercado… Além do CEO que foi demitido.

O vazamento que custou 70 bilhões de dólares para a BP

Imagem é tudo neste novo mercado. A reputação está na lista principal das prioridades de CEOs mundo inteiro. Ignorar a voz dos consumidores é se fechar para este mundo. Ouvi-la é se conectar.

O que importa é o que fazemos no dia-a-dia. Cada decisão de negócio. Os empreendedores e empresários que são movidos por uma causa, querendo transformar o ambiente onde atuam suas empresas não buscam desculpas nos impostos ou na fiscalização antiética. Eles direcionam o foco dos seus negócios para colocar em práticas seus valores, sua visão de mundo. Estes empreendedores têm o lucro trabalhando a favor da causa.

Na década de 80, a indústria tabagista fez de tudo para esconder os impactos do cigarro no corpo humano, lembrou um artigo da Harvard Business Review recentemente. No início deste milênio, a indústria alimentícia foi pró-ativa para substituir a gordura trans na alimentação, para melhorar a qualidade de vida das pessoas. Também no início desta década, os bancos começaram a analisar os impactos socioambientais dos empréstimos. Ou seja, o dinheiro que estou concedendo para clientes. Como ele vai ser usado? Se, por exemplo, em negócios como o desmatamento ilegal, além de prejudicial ao meio ambiente, pode virar uma multa que vai inviabilizar a empresa e vai impactar no pagamento do empréstimo. Uma incrível mudança de atitude num curto período de tempo.

Ao contrário da visão cartesiana, as empresas são cada vez menos vistas como sistemas mecânicos, mas sim como organismos vivos, que fazem parte de um todo. E organismos vivos possuem valores, que influenciam as atitudes na sua essência.

As empresas e os empreendedores não podem ser vistos como mal necessário, que precisa ser vigiado ou regulado. Mas para ganhar esta confiança, os líderes precisam expandir o alcance da empresa para além do lucro, criando um novo jeito de fazer negócios. E vejam só: empresas que se preocupam mais com estas questões têm uma melhor performance financeira. É o que temos percebido na análise de risco socioambiental das empresas elegíveis.

A preocupação com o novo jeito de fazer negócios está cada vez mais sendo valorizada pelo mercado, como na criação de índices e rankings. Um índice que mostra as 100 empresas mais éticas, feita pelo instituto Ethisphere, mostra que as empresas mais éticas tiveram performance até 50% superior comparado às empresas presentes no S&P 500, índice que reúne 500 grandes empresas. Outro estudo, da A.T. Kearney, mostrou que durante a crise financeira em 2008, as empresas que mais se preocupavam com sustentabilidade tiveram também performance melhor. A listas das melhores empresas para trabalhar tem retorno na bolsa maior do que as listadas nas maiores e melhores da Exame.

Ou seja, Respeito é bom – e dá lucro!

Pergunte para Ione e seu time de motoboys. Tony na Academia. Helenio no Roteiros de Charme. Ray na Interface. Yvon na Patagonia. Fábio Barbosa no Santander…

A causa de cada um deles é muito clara. É a mesma que a minha: acreditar que podemos transformar o mundo por meio da ação das empresas.

Para encerrar fica a pergunta: que mundo queremos valorizar com nossas empresas? Como podemos usar o poder transformador das empresas para construir um mundo melhor? Qual a sua causa?

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O herói planetário e a sessão sustentável do TED Global


Fila para pegar lugar bom em um dos dois andares do Playhouse, em Oxford

Um dos temas que começa a emergir com maior relevância no mundo empresarial e acadêmico ganhou força com a apresentação de Tim Jackson na sessão 8 do TED Global, em Oxford. Jackson tenta responder a seguinte questão: existe um modelo de desenvolvimento sem crescimento econômico? Para ele, estamos em meio a um dilema do crescimento: “Não podemos viver com isso, mas também não podemos viver sem isso.” Afinal de contas, o modelo econômico hoje está baseado no crescimento. A sociedade precisa comprar, para movimentar a economia, para gerar mais renda, mais emprego, mais desenvolvimento. O único porém é que isso é feito por meio do uso intensivo de recursos naturais. ˜Gastamos dinheiro que não temos, para comprar o que não precisamos, querendo impressionar gente com quem nem nos importamos.”

Tim Jackson, na sessão 8 do dia 3 do TED Global

Ele vai fundo na questão (veja mais no livro Prosperity Without Growth) e argumenta que acabamos por criar uma economia que privilegia uma parte menor da alma humana, o egoísmo. Para Jackson, está na hora de construir uma economia baseada no altruísmo ecológico. Sua definição de prosperidade: “Consiste na habilidade de se desenvolver dentro das limitações ecológicas de nosso planeta.” Jackson não é sonhador, mas pragmático. Não estamos falando sobre acabar com o capitalismo. Estamos falando em tomar ações para construir uma economia que tenha um propósito e não apenas o objetivo de crescer.

E é exatamente isto que move a empreendedora Jessica Jackley, que emocionou a todos ao se emocionar sobre seu trabalho. Doar dinheiro ou dar oportunidade? Sem dúvidas, a última. Jessica criou o Kiva, uma plataforma que faz a intermediação de microempréstimos para empreendedores de países pobres. Ela aprendeu que mais do que doações, o que os empreendedores precisam é de uma chance. “Enquanto estive na África entrevistando microempreendedores na África, ninguém me pediu uma doação. Pediram, sim, empréstimos˜, diz ela. “Aprendi muito sobre lucros e receitas de agricultores, seamstresses e criadores de cabras.” Em 2005, o Kiva intermediou algo entre US$ 500 000 em empréstimos. Hoje, cinco anos depois, intermediou US$ 150 milhões em empréstimos em 200 países!

O novo projeto de Jessica Jackley é o Profounder, que tem o objetivo de levantar capital para novos empreendedores, principalmente recursos de famílias e de amigos. O projeto nasceu inspirado no fato de que 85% do dinheiro levantado para novos negócios nos EUA vem de família ou amigos. Em geral, essa tomada de recursos é confusa e o Profounder vai ajudar a organizar. Ao final, mostrando como algumas pessoas que receberam quantias por volta de 100 dólares conseguiram mudar suas vidas, Jessica chorou no palco. Acabou aplaudida de pé, homenagem reservada apenas às melhores falas.

Ainda sobre impacto da emoção, a audiência recebeu Auret van Heerden, ativista na área de direitos humanos. Van Heerden começou lembrando a todos que o celular de cada um foi feito com metais minerados no Congo, onde há péssimas condições de trabalho, e que 80% dos remédios consumidos no mundo vieram da China ou da Índia, onde há pouca regulação sobre segurança no trabalho. “Eu não vim aqui pregar em se ter a preocupação com a cadeia de trabalho˜, diz van Heerden. ˜Isto não é novo. Para mudar a maneira como a cadeia de fornecimento mundial está organizada, precisamos de um mecanismo diferente para fazer com que os produtos cheguem às lojas sem sacrificar nossa segurança ou ética.” Ele disse que talvez a única chance que um garoto de 15 anos tenha de trabalhar em um lugar com boas condições de trabalho em países em desenvolvimento seja o fato de a empresa multinacional ter um código de conduta exigindo isso.

Quem sobe ao palco do TED em geral é alguém com contribuições relevantes à sociedade, moldada com muita entrega e idealismo. E foi esta a história que Peter Eigen contou para as cerca de 600 pessoas que lotavam o teatro Playhouse, de Oxford. Não à toa, em sua apresentação ao chamar Eigen, o host Chris Anderson o chamou de ˜herói planetário˜. Eigen ganhou esta alcunha pela coragem que teve de enfrentar a liderança do Banco Mundial, onde trabalhava, ao descobrir que as melhores coisas que tentavam fazer eram arruinados pela corrupção. Indignado com a situação e de ver os esforços acabarem no bolso de dirigentes corruptos, pediu as contas e abriu a ONG Transparência Internacional, para estimular a abertura e transparência de instituições ao redor do mundo. “Transparência é crítico. Você até se chamar de responsável, mas responsabilidade sem prestação de contas não funciona. A corrupção é um fenômeno internacional que uma nação não consegue lidar sozinha”. Para ajudar a colocar luz nesta situação, todo ano, a Transparência Internacional publica o International Corruption Perception Index.(O Brasil está na 75a posição. Lideram a lista Nova Zelândia, Dinamarca e Singapura.)

Além de ser um herói planetário, Peter Eigen é um sujeito boa praça. Em uma das festas de confraternização da conferência, ele presenteou um dos participantes com um clássico nariz de palhaço vermelho que carregava. Afinal, palhaço ele nunca foi, principalmente ao não se conformar com o que via enquanto trabalhou no Banco Mundial.

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Cardápio: redes sociais, sustentabilidade e comunicação

…e mais um almoço inspirador no dia de hoje. O grande amigo recente Pepe, surfista de alma e intelectual (atenção, não são raros, mas também não são comuns!), levou seu sócio Ricardo e quis me apresentar um ‘jornalista especializado em redes sociais’, o Manoel, que eu já conhecia. Foi um grande papo.

Primeiro, um pouco de frustração. Levei para o Pepe uma edição do Let My People Go Surfing, com a história de Yvon Chouinard, fundador da Patagonia, crente que ele gostaria. Ao vê-lo, Pepe mandou essa: “Ah, pouca gente consegue fazer o que ele está falando…”. Verdade, mas argumentei que Chouinard tem o grande mérito de provar que é possível, sim, criar um modelo diferente de negócios, onde o trabalho não impera sobre o resto, como, por exemplo, surfar em um dia útil de altas ondas. Ora, se elas estão lá e o trabalho também pode ser feito em outro horário, porque não surfá-las?

A conversa derivou para imagem das empresas, postura em redes sociais, novas mídias. E de repente, me vi em meio a dois papos paralelos. Eu e Ricado falávamos da imagem de instituições financeiras, como se dá a má fama por conta dos juros, apesar de que eles não são causados exclusivamente por bancos, mas também pelo tal custo Brasil. Ao meu lado, Pepe explicava porque é bom surfar para Manoel. Caramba, que mistura adorável. Papo cabeça sobre economia e surfe. A variedade de assuntos e possibilidades é o que torna a vida tão bela. Fechar os olhos para isso é perder um pedaço incrível do mundo.

Em seguida, começamos a falar de redes sociais, de TED, da intersecção entre sustentabilidade e web 2.0 e porque isso é relevante para o mundo atual. E aqui, compartilho os links que eu faria somente com meus amigos Pepe, Manoel e Ricardo, mas que são bons demais para ficarem com pouca gente.

O tema redes sociais e TED surgiu e eu logo fiz a conexão: Augusto De Franco. Se vocês gostam do tema, precisam conhecer a palestra dele no TEDxSP. Como as referências de “formação e lógica de redes” estavam todas sendo de fora, não poderia deixar de falar do grande Augusto. (E aqui vai um o resumo que fiz do TEDxSP 

Daí, a conversa foi para o tema sustentabilidade. Manoel dizia que essa era “a onda”. Aí, mencionei o Guia de Comunicação & Sustentablidade, do CEBDS (Centro Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), que recém foi lançado.

E não pude falar da grande referência: o Greenwashing Guide, da Futerra.

Links compartilhadas, uma reflexão. O ponto é: cada vez mais sustentabilidade está conectada com mídias socias, pois há uma intersecção entre as duas questões que abrange importantes temas como: transparência, autenticidade e credibilidade. Na Web 2.0, as conversas são de via dupla e o consumidor interage sem pedir licença. Isso é transparência. Isso leva a um modelo de relações mais sustentável. Este é o novo mundo. E este foi o cardápio de mais um almoço inspirador….

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O fim da reputação?

New York City, 2003, upload feito originalmente por Rodrigo VdaC.

“O anonimato vai ser o próximo luxo da humanidade.” Ouvi esta frase bombástica de um amigo meu em um almoço que tivemos esses dias. Foi mais um daqueles almoços em que chego meio ‘zonzo’ no trabalho à tarde. De tanto que os neurônios trabalharam, de tantas ideias boas que surgiram. Mas essa foi difícil de digerir. Na hora, pensei em todas as informações que tenho no Facebook, Orkut, Linkedin, Plaxo, Flickr e aqui neste blog.

Se em algum momento eu quisesse o anonimato, seria quase impossível tê-lo. “Mas vai ser tão luxo que já há empresas contratadas para apagar os rastros digitais de pessoas na internet.”

Mas fica a dúvida. No mundo cada vez mais interconectado em que vivemos, a carreira, os projetos, as possibilidades se contróem mais e mais baseados nas conexões em que temos e que construímos. Como conciliar essa necessidade com a vontade de estar anônimo? Existe essa possibilidade?

É um dilema e tanto. Principalmente porque há outra tendência em ascensão: o gerenciamento da reputação. Mesmo que alguém queira ficar anônimo, mais e mais informações chegam às redes via conexões. Amigos de infância, escola, colegas profissionais – há muita gente com o potencial de falar sobre nós na web. Tanto que há até quem fale no fim da reputação. Li no TechCrunch que está chegando um momento em que relevaremos cada vez mais má notícias sobre reputação. E que não vai adiantar querer esconder aquela foto ou informação indiscreta que você faz questão de manter anônima.

O mundo é cada vez menos off e cada vez mais on. Parece que veremos cada vez mais em uma sociedade que aprende a conviver com os ‘deslizes’ pessoais. Talvez uma foto indiscreta ou uma frase negativa sobre você tenha menor impacto sobre a decisão de contratá-lo para uma empresa ou para um projeto. Ponto positivo para a transparência. Ponto negativo para o anonimato. Certo?

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Denis, meu feedback sobre a Gotas

Caro Denis,

Como falamos em nosso almoço, ontem, segue meu feedback para a Gotas. Vai aqui, publicamente, porque acho que você não tem problemas com transparência. E nem precisa se preocupar, pois só vi coisa legal. Mesmo.

Meu objetivo ao entrar no avião era escrever o blog para  o TEDxSP (já está no ar, acesse lá:  É conversando que a gente se entende). Gosto de ‘guardar’ momentos como uma viagem de avião para ter concentração total. Entre outras coisas, o avião é o único lugar onde não toca telefone, não chegam e-mails (ainda…).

Só que levei a revista Gotas comigo. Uma única vez na vida fiquei sem ter o que ler na viagem – e foi chato mesmo. Em função disso, carrego sempre um livro e algumas revistas. Acho que a altitude abre minha mente. Ela voa.

E a bateria do computador estava arriada. Ainda bem. Acabei “tendo” que ler a Gotas. Achei uma espécie de mistura de Trip e Piauí, com coisas boas das duas.

Enquanto lia, pensei que o jornalismo vive de ideias, de texto bom. Encontrei isso certa vez e adotei como lema: “Não existe texto longo. Existe, sim, texto chato.”

A aventura editorial, como você mesmo chamou, começou com uma cópia descarada na capa. Cara, vocês chuparam na maior a capa de um livro de Miranda July. E assumiram.

Capa da revista Gotas, 'chupada' sem culpa da capa de um livro de Miranda July

Quer saber, qual o problema? Sempre tive que a imitação é uma homenagem, um presente, um reconhecimento a quem criou algo digno de ser copiado. Jean-Luc Godard disse certa vez que “O problema não é de onde você tira as coisas, mas para onde as leva…”

O problema é esconder. Falta de transparência é um problema.

Continuei lendo a revista e vi outras boas surpresas. A matéria dos rótulos é um achado, uma p. sacada. É reportagem em estado bruto. E é divertida pacas. Começa com um “Arrá!” Chama o rótulo de um produto de “malandrão”. Manda às favas a burocracia e a formalidade.

E me faz lembrar que no mundo 2.0 não existe espaço para enganação. A sociedade passa por um processo de “ensabiamento”. Você deve saber bem que o Pierre Lévy falou bastante sobre isso no conceito de inteligência coletiva. Ele falava do potencial da internet, de certo modo prevendo a tal da Web 2.0.

A transparência está turbinando sites como TripAdvisor e Amazon e qualquer outro que possibilite a avaliação de produtos e serviços. Nenhuma campanha de publicidade resiste a um produto ruim no mundo 2.0. Essa é a inteligência coletiva em ação.

Denis, se me permite, achei que faltou você mencionar o site www.comacomsolhos.com – uma boa ideia que mostra fotos publicitárias comparadas às fotos da vida real de produtos alimentícios à venda por aí. Veja abaixo:

Esfiha do anúncio e da vida real no Habib's

E Denis, francamente, que decepção: o baconzitos não é feito de bacon! Por essa eu não esperava. Que bom, pelo menos não vou passar perto da série de substâncias inomináveis que simulam bacon! (Lembrei de uma frase de um amigo: “o porco é o alquimista da natureza. Transforma lixo em bacon!)

A história de rótulos ‘malandrões’ não é novidade nossa. É praga mundial. Um estudo na Inglaterra mostrou que 98% dos rótulos de produtos autodenominados sustentáveis não tinham nada disso.

E a Gotas segue bem. Há uma matéria falando de como o espaço afeta nossos laços com a comunidade e como se relacionar melhor com a cidade onde vivemos.

Gostei dos infográficos legais, das sacadas de transparência, da discussão cabeça de Lessig e de ver meu amigo Otávio Rodrigues em plena forma.

E, veja só, o voo de São Paulo para Porto Alegre acabou pousando em Floripa quando não conseguiu aterrisar nos pampas devido ao aeroporto fechado.  Deu para ler a revista de cabo a rabo e chegar à conclusão de que nasceu aí um belo projeto editorial.

Denis, força aí, faz esse número 2 decolar. Não deixa essa ideia boa no papel.

Abraço

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Maior transparência no mundo digital ou “o fim dos jabás nos blogs”

Reguladores americanos estão criando uma lei que obriga a ter uma maior transparência na publicidade e promoção de produtos e serviços via redes sociais. È cada vez maior o número de anunciantes que aproveitam blogs concorridos para falar de seus produtos ou serviços. Minha esposa já teve oferta de uma grande fabricante de fraldas para postar no blog dela e conheço outros casos do gênero. A idéia é bonitinha, mas ordinária. A empresa oferece alguns produtos para testar e o blogueiro vai lá e fala. Em sites de celebridades, isso é uma beleza para a marca, vende feito água. Mas, como saber se a pessoa está sendo autêntica ou está ganhando para fazer propaganda de algo? Na televisão, a gente tem certeza. Por mais toscos que sejam os anúncios, como da Locaweb e o Dan Stulbach (que é ótimo ator, mas não para vender cloud computing!).

Definitivamente, é cada vez mais difícil trabalhar nas sombras! Quando será que isso vai chegar no Brasil.

Alguns trechos abaixo. A matéria completa está no NY Times.

“The new rules also take aim at celebrities, who will now need to disclose any ties to companies, should they promote products on a talk show or on Twitter. A second major change, which was not aimed specifically at bloggers or social media, was to eliminate the ability of advertisers to gush about results that differ from what is typical — for instance, from a weight loss supplement.

For bloggers who review products, this means that the days of an unimpeded flow of giveaways may be over. More broadly, the move suggests that the government is intent on bringing to bear on the Internet the same sorts of regulations that have governed other forms of media, like television or print.

“It crushes the idea that the Internet is separate from the kinds of concerns that have been attached to previous media,” said Clay Shirky, a professor at New York University.

Richard Cleland, assistant director of the division of advertising practices at the F.T.C., said: “We were looking and seeing the significance of social media marketing in the 21st century and we thought it was time to explain the principles of transparency and truth in advertising and apply them to social media marketing. Which isn’t to say that we saw a huge problem out there that was imperative to address.

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